A criatura de Frankenstein não é apenas um corpo costurado em laboratório. É, sobretudo, um ser sem lugar. Não pertence ao mundo dos homens, que a rejeitam pelo rosto disforme, nem ao mundo dos monstros, onde não há ninguém que se reconheça nela. Habita um espaço vazio, um entremeio, uma espécie de não lugar. Essa condição nos provoca porque toca algo de muito humano. Quem nunca se sentiu estrangeiro, mesmo em sua própria casa, em sua própria cidade ou até em seu próprio corpo? A criatura apenas torna visível, de modo radical, a sensação de não pertencer — de estar sempre um pouco deslocado, sem morada simbólica. Do ponto de vista existencialista, ela encarna o absurdo de que falava Camus: está aí, sem origem natural, sem genealogia que lhe dê raiz, vivendo sem justificativa. E, como em Sartre, seu corpo é sempre um corpo-para-o-outro: não é vivido em liberdade, mas devolvido como objeto de repulsa. Seu destino é ser olhada, mas nunca reconhecida. No entanto, a criatura deseja. Deseja ...