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Da Ficção a Realidade?


 “Entenda seus medos, mas jamais deixe que eles sufoquem os seus sonhos”.

(Alice no País das Maravilhas)

Sobre o autor da ficção

Em 1865 foi publicada uma das obras infantis mais famosas de todos os tempos, escrita pelo inglês Charles Lutwidge Dodgson, mais conhecido pelo pseudônimo Lewis Carroll. Embora fosse um matemático, ele é mais conhecido como autor das aventuras de Alice no País das Maravilhas se popularizou pelo longa-metragem animado da Disney, lançado em 1951. Cheia de enigmas e simbologias, a narrativa é composta por personagens emblemáticos que nos levam a várias reflexões.

As aventuras de Alice que desce por um buraco para emergir no País das Maravilhas transformara Lewis Carroll, um autor reconhecido e bem-sucedido. Alice Liddell era uma das três filhas de um colega da Oxford (Christ Church), a quem o escritor costumava entreter com suas histórias sobre o inquieto coelho branco, o Gato de Cheshire ou o Chapeleiro Maluco. Durante um passeio de barco pelo Tâmisa com as pequenas da família Liddel, teria surgido a ideia de um novo livro que com o tempo acabaria lendo um imenso impacto cultural, do que beberam até hoje tantas e tão diversas manifestações artísticas.

Pensar a vida a partir da ficção

A protagonista da obra é uma menina inglesa de sete anos extremamente inteligente e articulada para a idade que acredita saber quase tudo procurando agir como os adultos com os quais convive. Tudo se altera quando ela vê um Coelho Branco passando no jardim, vestindo um colete e segurando um relógio – “Logo depois Alice entrou atrás dele, sem pensar sequer em como sairia dali outra vez” (Alice no País das Maravilhas). Diante de algo tão novo e incompreensível, ela não paralisa, mas se move pelo instinto da curiosidade e resolve segui-lo, sem sequer pensar nas consequências. Ela se permite uma aventura num mundo onde tudo é diferente e desafia a racionalidade, representando a imaginação que é própria da infância. Os comportamentos absurdos dos habitantes do local a confrontam, bem como a irracionalidade daquele lugar e ela fica assustada, frustrada e até furiosa com a falta de ordem e normas sociais daquele lugar. A menina precisa se transformar e questionar tudo o que aprendeu até ali, porém, alguns dos seus valores se mantêm. Ela luta até ao final para ser escutada e se revolta com as injustiças que assiste ali naquele lugar.

Reflexões que surgem na sessão de análise.

Quero propor algumas reflexões nesta coluna de hoje e na das próximas semanas em torno deste mundo de Alice, pois aquela atitude de seguir o coelho e se colocar disponível para algo acontecer é algo muito importante num processo de psicanálise. Quando paciente e psicanalista se encontram é sempre um ponto de partida para algum lugar, porém se colocar ali frente a frente é um tanto desafiador (“desafia-a-dor”), mas quando se chega no consultório o/a paciente está se colocando diante da possibilidade de algo acontecer, pois ali não são apenas momentos e sim movimentos. O psicanalista britânico Wilfred R.Bion chamava a atenção para o fato de que o paciente que entra numa sessão de analise não é o mesmo que sai. Ali na sessão não são poucos os pacientes que chegam querendo respostas, querendo ser escutados num mundo onde cada vez mais as pessoas só querem falar e todo mundo está falando algo nas redes sociais. Como diria Rubem Alves: “Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir”.

Questionamentos que vão para além da sessão.

Fazer análise é se colocar numa aventura de pensar e repensar a vida e voltar a perguntas simples mais que geram profundas reflexões: Quem sou?  De onde sou? Quando sou? Refletir sobre isso nos coloca num momento de coragem rumo um autoconhecimento, sabendo que como em Alice, seguir para a toca do coelho sem saber o que pode acontecer é se colocar disponível para qualquer coisa acontecer e se manter diante de tudo é um desafio. Se colocar numa experiência de psicanálise e possibilitar movimentos criativos que podem nos ajudar a nos reinventar perante os dilemas da vida. Onde você está nesta vida que vive hoje? Quando você realmente está na vida? Quem é você na vida? Sendo assim, concluo este texto de hoje com uma pergunta que é atribuída a Freud: "Qual a sua responsabilidade na desordem da qual você se queixa?".

 

Daniel Lima

@daniellima.pe

*Texto publicado no Jornal do Sertão

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