Pular para o conteúdo principal

Silêncio!



Quem nunca esteve num ambiente com uma plaquinha ou cartaz que tem uma imagem de uma pessoa com o dedo indicador sobre os lábios? Até nos vem à mente aquele som: “psiiiiii”. Em bibliotecas o silêncio é necessário para não atrapalhar a concentração, já em hospitais para não incomodar. Que tal fazer um “psiiii” para nossa mente? Exatamente, mandar ela aquietar e parar o barulho ensurdecedor que fazemos indo em busca de uma felicidade imposta por familiares e até pela sociedade. Todo esse anseio mexe com cada cômodo do nosso ser gerando em nós um constante estado de inquietude, pois parece que tudo nos falta. Este estado faltoso é que parece alimentar essa vida desenfreada que temos, nos movimentando o tempo todo pra fora sem percebermos os sutis movimentos dentro de nós.

Às vezes precisamos de alguém que perceba nossa inquietação e nos diga que precisamos fazer silêncio em nós. Se de fato queremos viver, não podemos ficar apenas no ver a vida acontecer diante de nós sem nos percebermos nela, porque não estamos aqui, mas num futuro que ainda nem existe e que será naturalmente fruto do hoje, do agora. Sendo assim, querer mudar o futuro não é voltar no tempo e mudar o passado, mas parar de nos dar desculpas e mudar o hoje, pois o amanhã depende disso e não do ontem. O filósofo Blaise Pascal já dizia que “jamais vivemos, mas esperamos viver; e dispondo-nos sempre a ser felizes, é inevitável que jamais o sejamos”. Adiamos o viver intensamente, não desfrutamos intensamente cada instante, estamos o tempo todo correndo atrás do vento em busca de uma vida sempre feliz. Isto nunca chegará! Precisamos dos dias tristes e felizes, assim como precisamos de frio e calor, noite e dia… Assim como na bela tela de um grande pintor existe lindas e vibrantes cores, também existem cores densas, escuras, assim é nossa jornada. È a multiplicidade de cores existenciais que dar beleza a vida.

Silenciar, não nos impede de desejar, pelo contrário, nos ajuda a perceber o que de fato e de verdade desejamos, pois tudo que procuramos está em nós para se transformar em ação realizadora através de nós. Foi Espinosa que certa vez disse: “O desejo é a própria essência do homem, ou seja, o esforço pelo qual o homem esforça-se por perseverar em seu ser”. Somos seres desejantes, mas o silêncio em nós é como uma lente de aumente que se movimenta investigativamente dentro de nós, isto mesmo, é um olhar atento para dentro de nós, a fim de que desejemos nosso desejo e não os desejos dos outros. Quando sonhamos o sonho do outro corremos atrás de algo que nunca nos satisfará, trazendo para nós a sensação de que a vida é uma ilusão. Vivemos numa era imediatista, queremos tudo pra ontem, porém “entre os desejos e as realizações destes transcorre toda a vida humana” (Schopenhauer).

Silêncio! Aquietemo-nos para que nossa atenção não fique ocupada com as muitas exigências externas. Desliguemo-nos um pouco, deixemos todo barulho do lado de fora, pois aquietar-se nada mais é do que estar aqui, no presente e prestar atenção em si. Em que estamos pensando neste momento? Onde estão nossos pensamentos? Onde está nossa atenção? Então, façamos silêncio para estarmos conosco e nos sentirmos. Isto é imprescindível para uma auto percepção. Se queremos chegar a nós mesmos o “psiii” na mente nos possibilita a chegar em nós mesmos, deixando o mundo ruidoso para trás e simplesmente nos sentir. Sabe qual o momento mais valioso? O agora! Portanto, façamos aquilo que temos para fazer no presente com toda atenção, como se o mundo inteiro dependesse disso, porque o valor só reconheceremos quando conseguirmos estar plenamente no agora.

 

Daniel Lima Gonçalves

Psicanalista, Filósofo e Teólogo.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Teu Colo

Corro para ser acolhido em Teu colo sem precisar embriagar- me com o vinho do moralismo. Não é necessário maquiar-me com o pó do ritualismo, tão pouco adornar- me com o legalismo, pois sei que me aceitas como sou. Quero Teu colo, necessito dele, porque desejo ouvir tua voz mansa e suave. Para estar no Teu colo preciso esvaziar- me dessa construção de um deus justiceiro e impiedoso que fizeram em mim; preciso esvaziar-me do passado que me oprime dia e noite e ser cheio de confiança que me dá a certeza que sou aceito por Ti. Não importa o que disseram, dizem e dirão sobre mim, pois sei que a última palavra vem de Ti e dizes: “meu filho, não temas, pois mesmo não merecendo meu amor eu te escolhi para amar-te sempre mais e mais”. Teu colo é meu abrigo secreto, ou melhor, é meu oásis em meio a este deserto existencial que nem sempre está fora de mim, mas quase sempre dentro de mim. Quando estou nEle, não preciso nem falar, pois me ensinaste que a melhor oração não é fruto de um  prol

UMA REFLEXÃO PERTINENTE

Nos últimos dias e, ainda início de 2019, nossa nação tem vivenciado momentos de dores e uma tristeza solidária diante de calamidades e tragédias que tem nos deixado perplexos na imprevisibilidade de existir. Lama, água, fogo e acidente nos faz viver uma sensação de um luto generalizado. O povo brasileiro neste começo de ano tem estado imerso numa profunda comoção e isso se manifesta socialmente de diversas maneiras, que apesar de pluralizada em sua essência traz a singularidade de cada indivíduo. Muitos parecem sentir uma intensa angústia fóbica por se depararem constantemente com a incerteza do logo mais. Outros mergulham numa melancólica e desesperadora reflexão ao olharem para histórias interrompidas, sonhos que não foram vivenciados, momentos que não foram vividos e, em se deparando com isso, acabam tendo que lidar com um recorrente pensamento: “ devia ter ”. O tom de lamento pelo não vivido, ou pelo que se poderia ter vivido; devia ter feito, ou não devia ter feito. É, a no

Identidade na diferença

Eu? Como assim eu? Se nem sei exatamente o que sou. Tornei-me isso que, dia após dia, muda e não sei o que serei, pois, ainda estou sendo uma metamorfose incessável. Este ser que diz, eu, é o mesmo que diz fui. Isto mesmo! Olhando para trás vejo que fui alguém que não sou mais, mas era eu lá, e sou eu aqui, mas o ser de hoje não esteve lá, pois, é fruto, produto de tudo que vivenciei no decorrer dos anos. O ser de ontem também dizia: "eu sou assim". No entanto, hoje me vejo de outro modo e percebo que não era daquele jeito, assim como não sou hoje o que serei amanhã. Então, o que sou eu afinal? Algo que transcorre e escorre no tempo? Sou ou que estou sendo? Eu sou o que foi aprimorado no tempo?   Esse ser que abre a boca e diz, eu sou, é tão relativo que uma simples relação com pessoas diversas gera uma mudança no que se diz ser, passando a ser produto da influência relacional. Sendo assim, o eu de hoje, mais adiante, será outro e não mais o que se é. Se digo que